O seguinte ensaio pretende dar uma ideia de vários trabalhos de pintura, escultura e arquitectura efectuados no Algarve durante o século XX e cuja obra se caracteriza dentro do movimento conhecido por modernismo.
Segundo Francisco Rosa Dias (Dias, 2022, p. 19), em 1923 o pintor Roberto Nobre propunha que fosse criado no Algarve um museu de pintura. Isto porque em Lisboa haviam ocorridos 5 exposições havia pouco tempo de artistas algarvios, reconhecendo que havia pelo menos 7 nomes, todos eles, no entender de Nobre, ”pintores algarvios ou residentes no Algarve, ou pintando sobre o Algarve” (sic), estando entre eles o notável Eduardo Viana, então a residir em Olhão.
Um nome que salta à cabeça dos pioneiros do modernismo em Portugal foi Carlos Filipe Porfírio (1895-1970) (Rosa, 2019), farense de nascimento e que interagiu com nomes do Modernismo como Guilherme Santa-Rita, Fernando Pessoa ou Almada Negreiros. Foi editor do único número da revista Portugal Futurista e era autor uma rubrica no semanário regional Heraldo, pertença do também pintor Carlos Lyster Fraco, onde se publicaram poemas de Mário de Sá Carneiro e Fernando Pessoa. (Dias, 2022, pp. 29–30).É autor de vários trabalhos que se encontram dispersos pelo Algarve. Foi cineasta e pintor, e entre as suas obras encontram-se o interesse por paisagem, cinema, costumes, arquitectura e religião. Enquanto etnólogo, recolheu instrumentos de trabalho agrícola, trajos regionais e outros utensílios, reunindo-os para a colecção permanente que constitui o acervo do museu etnográfico do Algarve, do qual foi o primeiro director. O seu trabalho mais conhecido é a pintura a óleo Paisagem Algarve, que se encontra neste museu. Neste trabalho, o artista algarvio retratou uma vista sobre uma típica urbe algarvia, pontuada por açoteias coroando figuras geométricas ligadas por escadarias e empenas, as quais o seu autor realça com bastante peculiaridade, como uma malha emaranhada e intrincada, com o mar ao longe no fio do horizonte a delimitar a cena e como que a trazer “ordem” à cena. De contornos marcadamente cubistas, de certa forma evoca uma obra de Eduardo Viana intitulada Pousada de Ciganos (Lapa, [s.d.]) (Leal, 2022), concebida em Olhão em 1923 e que levou a rotular a então vila como “vila cubista”.
Na arquitectura temos a destacar o vila-realense Manuel Gomes da Costa (1921-2016) que se radicou em Faro depois da conclusão do seu curso de Belas Artes no Porto, para onde se mudou depois da desilusão na Faculdade de Belas Artes de Lisboa, desiludido com a pouca abertura ao debate de ideias devido à vigilância da PIDE (Agarez, 2016) Foi no Porto que conviveu com os conterrâneos Vicente de Castro e Manuel Laginha e foi aluno do arquitecto pioneiro Carlos Chambers Ramos, que por acaso havia criado o Bairro dos Pescadores de Olhão em 1923,
hoje classificado. Por toda a cidade de Faro vemos as marcas do seu trabalho: A começar pelo edifício Tridente, o mais imponente da cidade, terminado em 1979 (Edificio TRIDENTE – The Modernist Architecture Walking Tour – PocketSights, [s.d.]). Em Faro o arquitecto restaurou o antigo Palácio da Província usando o estilo tradicionalista Português Suave bastante cultuado pelo Estado Novo, para nele instalar a Comissão de Coordenação Regional, e onde se encontra o já referido museu regional do Algarve.em contraste com outro edifício na mesma praça onde seguiu os princípios do modernismo. (Drago e Gonçalves, 2021) Por toda a região colaborou em cerca de quatrocentos edifícios (Agarez, 2016), deixando uma comunidade de engenheiros civis, desenhadores, mestres de obra e construtores adeptos dos seus trabalhos.
Não apenas residências privadas e apartamento, como equipamento social como lagares de azeite, cooperativas agrícolas, pavilhões gimnodesportivos, um colégio e uma igreja fazem parte do seu portfólio. Na sua obra procurou sempre seguir ideias próprias do que emular outros trabalhos.(Parra Bañón, 2020, p. 65) Nalgumas situações recorreu a soluções de compromisso entre técnicas de edificação tradicionais e ideias modernas.
O seu estilo é marcado por linhas direitas, ortogonais, segundo o estilo internacional de Le Corbusier. (Oechslin e Wang, 1987) Nas residências onde podia dar azo à sua criatividade aparecem decorações como mosaicos de pequenos azulejos por cor que no conjunto assumem padrões pontilhados por côr.
Apesar da profusão de arquitectos e pintores modernistas algarvios, a nível de escultura, não temos nomes de relevo que sejam de destacar na região, por isso vai-se abordar a escultura de título Sebastião, da autoria de João Cutileiro, exposta ao público em Lagos, onde o autor viveu durante 15 anos. Estátua essa que foi inaugurada em 1973, e que pretende representar o malogrado rei D. Sebastião. Bastante polémica, como é apanágio das obras deste escultor, Cutileiro pretendia transmitir a ideia do rei enquanto uma criança, sendo que os blocos de mármore que representam a armadura, pouco trabalhados, e a cabeça pintada como de um boneco infantil se tratasse, pretende reforçar a ideia da inadequação do personagem em relação à armadura que o enverga, da mesma forma como foi inadequada a participação portuguesa nos terrenos de Alcácer Quibir. (Laranjo, 2010, p. 102)
BIBLIOGRAFIA
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