O “Arco Triunfal” feito em placas de madeira

Em 1438 Johannes Gutenberg, um alemão ferreiro filho de mercador,, inventa a primeira máquina tipográfica. Há quem diga que não foram apenas as descobertas marítimas de além-mar que iniciaram o Renascimento, juntamente com a proliferação de riqueza em terras italianas que permitiu o mecenato aos grandes artistas como Leonardo de Vinci, Miguel Ângelo Buonarroti, entre outros. Mas foi a invenção do ferreiro alemão o principal motor por tudo que surgiu no Renascimento – a massificação da imprensa, permitindo a transmissão de novas ideias por via do papel impresso e que resultou em última análise no maior evento do Renascimento – o advento do Protestantismo.  A Bíblia foi obviamente o primeiro livro a ser reproduzido em obra. Em Portugal em Faro em 1487 terá sido impresso o “Pentateuco” (conjunto dado aos 5 primeiros livros da Bíblia) . Aqui está uma lista das principais obras impressas logo a seguir a 1438 e até 1500.

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Os dois Portugais (urbano vs rural)

 

two pt rectangles with their backsToda a discussão que se vem assistindo nos últimos dois dias a respeito das touradas nas redes sociais parece-me condenada a cair em saco roto, como o sexo dos anjos. Já há muitos anos houve uma tentativa por parte de um grupo defensor dos animais de impedir a realização das Touradas de Barrancos, que se primam por serem as únicas onde não é cumprida o quase centenário banimento dos touros de morte no nosso país. Este ano o Partido dos Animais e Natureza (PAN), mais um grupo de cidadãos decidiu levar “atrever-se” a elevar a fasquia e tentar suspender a realização de toda e qualquer tourada no nosso país através de um projecto-lei.  O PAN foi mais avante e aproveitou para apresentar na autarquia lisboeta outra proposta para terminar com as touradas no Campo Pequeno. Mais tarde o Bloco de Esquerda apareceu a juntar-se ao PAN com a ideia de proibir as touradas na TV.

Toda a telenovela deste último mês pode ser consulta resumidamente no jornal Público. Verdade seja dita, desta vez acho que pelo mesmo princípio deviam proibir a matança do leitão, o abate de borregos, e também suspender quaisquer “números” envolvendo bestas em espectáculos circenses, para bem da coerência. Grupos estes que provêm do Portugal Urbano, que começou em Lisboa desde o século passado e que desdenha do Portugal Rural, o qual só salta para as notícias quando vêm notícias de calamidades (incêndios, desertificação, envelhecimento…). Este Portugal Rural teve origem praticamente desde o início da fundação da nacionalidade. Poder-se-iam dizer que muita da sua cultura e tradições virão desde tempos primevos. O folclore, as histórias fantásticas de criaturas fantásticas de mouras encantadas e outras criaturas que tais tudo são características desse Portugal Rural em vias de extinção e desaparecimento. No caso da região portuguesa de que sou residente, o Portugal Rural está condenado ao desaparecimento sob um mar de betão, campos de golfe, interesses económicos hostis que sabem manipular os fracos poderes decisórios da região, contorná-los a seu belprazer. O Algarve é tradicionalmente dividido em três zonas: Serra, Barrocal, Litoral. Os primeiros empreendimentos turísticos como alojamentos hoteleiros começaram todos no litoral, mas ao pouco foram encontrando também espaço para progredirem em direcção ao interior ao ponto já de termos um campo de golfe em plena serra (não vou dizer para lhes fazer publicidade). Lado a lado com o Algarve Rural, existia até há 50 anos um Algarve das pescas, todo ele centrado na pesca de uma espécie de peixe chamada Atum Vermelho. O definhar dos seus cardumes e a Nova Era do Turismo Massificado que começou nos anos sessenta com a construção do Aeroporto ditou uma viragem. O Algarve Rural vai sendo aos poucos substituído pelo Algarve como marca turística de destino de férias para todo o tipo de classes económicas.

Mas voltando atrás, e ao assunto com que iniciei este artigo, vejo nesta discussão de amantes vs. detractores das touradas um confronto entre este dois Portugais, o Portugal Moderno e Urbano dos centros urbanos em oposição com o Portugal Rural, antigo, milenar e ainda resistindo. Esta discussão das touradas tem tudo a ver com isso. Os animais nas cidades terão melhores condições de vida do que no campo !? Existem vegetarianos amantes de agricultura biológica a dar uso a solos abandonados no Interior do país. Já todos sabemos isso, as assimetrias litoral / interior, a debandada da juventude para o litoral ou para o estrangeiro. Estas tradições como as touradas e a matança do leitão que parecem rituais bacocos e sem sentido para quem nasceu e cresceu numa cidade e que olha todas as espécies de animais como animais de companhia, e passíveis de não serem alvo de sofrimento inútil e ignóbil, olhando para as touradas da mesma forma para os mais ancestrais combates de cães, grilos e galos.

Pessoalmente, nasci no Portugal Rural encostado ao litoral. Na minha infância, perdia a conta aos galos que ouvia cantar de manhã cedo que respondiam uns aos outros. Habituei-me a ouvir as partidas das traineiras para o mar ao sol nascente como melodia do próprio alvorecer. Nasci no Portugal Rural e Litoral antigo, mas eu não mudei de residência, tudo à minha volta é que mudou. A minha localidade de residência passou de lugar de residência permanente para estância de veraneio em 30 anos. Acabou a pesca, vieram os turistas. Foram-se os galos, as traineiras e todos os sons da natureza. Antigamente conseguia caminhar na falésia que liga a minha localidade com a sua vizinha a leste mais antiga a pé, sem obstáculos. Actualmente, já não é possível, por todo o lado, foram erguidas vedações, ou colocados cães de guarda, ou portões. Sinto saudades do Portugal Rural da minha infância. Vivi uns quantos anos da minha vida em Lisboa, e confesso que nunca me consegui adaptar a viver num local com tanta gente. Estava habituado a viver numa terra onde me habituava a ver todos os dias as mesmas caras no transporte público que me levava para a escola na sede do meu concelho. Quando fui estudar no Superior para a capital, foi isso que mais me custou, perder a minha “ruralidade” , ver caras diferentes nos transportes públicos todos os dias.  Tenho saudades da infância e da minha aldeia de pescadores (agora transformada em vila turística, cercada de prédios que estão vazios fora dos meses de Verão).

O Portugal Rural tem o seu quê de rude e animalesco é verdade, mas sempre foi assim desde há séculos. Habituados ao convívio com a Natureza, encontravam nos Touros de Lide uma forma de afirmarem o domínio da espécie humana no meio rural sobre as suas criaturas. Os rituais de uso de bovinos é milenar e há provas disso desde uma das primitivas civilizações (a civilização minóica, pré-clássica, de Creta). Mas estamos a desviar-nos do essencial.

O assunto aqui em questão é esta dicotomia Portugal Rural Antigo contra Portugal Moderno Urbano. O caso dos incêndios providencia também um excelente exemplo deste conflito. Mas isso ficará para outro tempo.

Apesar de tudo o que disserem, iremos continuar a ter corridas de touros no Campo Pequeno e outras praças no país e touros de morte em Barrancos. Mas, uma vez mais, as coisas podiam ser mais suavizadas. Derramar sangue na arena, e a assistência de menores era algo que poderia e devia ser legislado.

 

O que é que uma coisa tem a ver com a outra !?

Brasão do Reino do Algarve – uma farsa !?

1666 dutch map vs 1666 tesouro da nobreza
Duas versões do “presuntivo” Brasão do Reino do Algarve, ambas do século XVII: a da esquerda é holandesa e figura no Atlas Contractus de Johann Janssonius (1666), a segunda é portuguesa e é referida no Thesouro da Nobreza de Francisco Coelho (1675)

ACTUALIZAÇÃO: Foi criado o artigo sobre o brasão do Reino do Algarve na Wikipédia. Escusado dizer quem é o autor original.

Na wikipédia tudo pode ser editado e tudo é editável e também pode haver membros da comunidade que, por opinião meramente pessoal insistirem num ponto de vista que quando descamba em desfavor, levam a discussão ao ponto de se auto-ridicularizarem. Foi o que aconteceu depois de um dos membros desta comunidade eliminar o brasão de armas que ilustrava a infocaixa do artigo da wikipédia sobre o Reino do Algarve sob o pretexto de o mesmo nunca ter sido usado pelas autoridades que governavam a província equiparada a um reino titulado, mas ser apenas uma fantasia criada por um ilustrador de mapas holandês do século XVIII. O que é certo é que o referido brasão figurou no artigo durante muito tempo sem ninguém o pôr em questão, assim como continuar a figurar no artigo homólogo da wikipédia inglesa e na espanhola . Fiquei um tanto espantado com a remoção, quando para mais o dito sujeito escusava-se sem demoras e sem explicar as razões da sua acção. Decidi repõr o brasão na infocaixa. Resultado: um “senhor administrador” qualifica a minha acção como “vandalismo”, colocando-se do lado do outro indivíduo detractor do brasão do Algarve, provavelmente seu “protégé”. Confronto este sujeito, e a resposta dele é pôr-me na frente a “carta de princípios da Wikipédia” com a ideia de que quem insere informações é quem as deve provar depois ( aquilo a que o fulano chamou “Ónus da Prova“). Em primeiro lugar, não fui eu que adicionei o brasão, ele esteve patente durante algum tempo, e sou tratado pelo sujeito, que venho a saber é um sysadmin da Wikipédia, como se fosse quem tivesse inserido o brasão, para além de ter sido tratado como se fosse um “vândalo“. Isto levou-me a pensar que a wikipédia é controlada por indivíduos que, abusando do seu poder dentro da comunidade, fazem valer as suas opiniões em função do estatuto que têm na sua comunidade e podem tratar qualquer colaborador (eu, por exemplo, que já tenho umas quantas centenas, senão milhares de bytes de texto editado na Wikipédia portuguesa) como se fosse um vândalo caso estes expressem opiniões contrárias às suas. Volto a confrontar o sujeito na página de discussão do artigo, ele finalmente, após várias vezes solicitado da minha parte para explicitar os seus motivos, lá se descose, e diz porque não acredita este brasão alguma vez ter sido utilizado pelo Reino do Algarve enquanto ele existiu (desde 1249 até 1834, fim da monarquia absoluta), quando fui substituído pelo “Distrito de Faro”. Apesar de tudo diz que o desenho existe, é um facto, mas foi usado apenas por ilustradores de mapas e nunca por portugueses e que hoje ele é apenas conhecido por algures no século XX, a câmara municipal de Silves, quando pretendeu redesenhar o seu brasão, ter perguntado à Sociedade Portuguesa de Arqueologia, na altura a autoridade portuguesa em termos de Heráldica, ter proposto a redefinição do brasão de Silves inspirando-se nos rostos dos reis mouros e reis cristãos que figuram no tal escudo, acto que levou a que as restantes autarquias algarvias também requeressem a mesma “renovação” do seu brasão de armas, tornando-se um denominador comum de todos os brasões dos municípios da região, a presença de um rei mouro e um rei cristão no escudo da autarquia. E que só depois disto é que toda a gente começou a pensar que o “Reino do Algarve” teria tido no passado usado este escudo em virtude desta reforma das armas. Mas, eu fui consultar outras fontes, e graças a elas, descobri num armorial português do século XVII – o “thesouro da Nobreza“, quase da mesma época que o Atlas holandês que deu a primeira versão do brasão, que surge um brasão quase idêntico, com a diferença de figurarem dois rostos em vez de apenas um em cada um dos quartéis do escudo algarvio e, claro de faltar a coroa e as cores amarela e vermelha do fundo dos quartéis. Não sei se Francisco Coelho, autor do Thesouro terá estado em contacto ou teve conhecimento do Atlas Contractus do holandês Johan Janssonius, mas se não esteve, a coincidência é boa demais para se tratar de um mero acaso, a grande semelhança entre os dois escudos. Quando confrontado com o escudo proveniente do armorial português, o meu correligionário da wikipédia pergunta “O que é uma coisa tem a ver com a outra?”. Eu estive para responder “O que é que o c… tem ver com as calças?”. Mas, dada uma das regras da wikipédia é não levar a discussão do tema para o tom de ataque pessoa, decidi ser sarcástico e expressar o que minha na alma de uma forma subtil. A discussão acabou por ali, pelos vistos o meu caro correligionário não gostou da minha ironia enquanto outro utilizador, observador, veio propor tréguas afirmando que o escudo poderá aparecer no artigo, mas não na infocaixa, proposta que aceitei de imediato, sem qualquer resposta por parte do senhor “sysop” da Wikipédia que provavelmente virá todos os verões apreciar o nosso Algarve, e não lhe agrada que o Algarve no passado tido um estatuto de “Reino”, se bem, a bem da verdade, apenas de uma forma simbólica e formal, e porque não a sua região (que desconheço qual seja) não deveria ter tido também esse direito. A discussão que tive com o sujeito está toda aqui.